"Lições de casa devem incluir atividades que relacionem os conteúdos disciplinares com questões atuais e com a vida dos estudantes
Desde os primeiros anos do Ensino Fundamental até a conclusão da Educação Básica, espera-se que crianças e jovens desenvolvam conhecimentos e habilidades para se comunicar, compreender o mundo, fazer escolhas e desenvolver suas potencialidades. Esses conteúdos de instrução e formação, adequados à faixa etária de cada etapa escolar, são relacionados sempre que possível à vida e ao contexto dos alunos. Eles podem também ser objeto de atividades mais significativas e estimulantes do que os rotineiros deveres e tarefas de casa, pois é maior o envolvimento dos alunos quando o que se aprende na escola está associado ao que se faz fora dela. Tenho observado iniciativas de professores ou de escolas em que essa prática, muitas vezes articulada ao planejamento do ensino, alcança resultados encorajadores.
Isso ocorre quando se mesclam conteúdos com atualidade, avaliações que
verificam as habilidades -- mais do que a retenção de informações -- e
atividades extraclasse com contexto real e objetivos claros, como nos exemplos
que menciono a seguir. Uma criança no 4º ano pode ajudar a preparar e anotar a
lista de compras semanais de sua família, e não somente descrever a mesma
gravura que seus colegas descreverão. Junto com seus pais, pode fazer uma
tabela dos produtos que faltam ou que estão se esgotando, anotando algumas
informações, como sua natureza, a marca ou o tipo de vasilhame e a quantidade.
Pode também acompanhar as compras, somando os valores e antecipando o total
para não ultrapassar os recursos disponíveis.
No 6º ou 7º ano, pode fazer um mapa de origem e deslocamento de seus familiares
ou antepassados e descobrir por que migraram. Um questionário deve ser
preparado com antecedência em classe, juntamente com a orientação para as
entrevistas. As histórias, depois, são sistematizadas e apresentadas em classe.
Já um jovem do 8º ano pode avaliar a relação entre a soma das horas sob o
chuveiro e as contas mensais de água e energia e avaliar o impacto do uso de
chuveiros e outros equipamentos de maior potência nas contas de sua casa e o
peso delas no orçamento doméstico, assim como o custo do gás de cozinha ou do
combustível do automóvel. Em classe, pode estudar a demanda de energia no país
e das principais fontes energéticas disponíveis, como hidroeletricidade,
petróleo e biomassa.
Mais do que nas tradicionais tarefas de casa, os próprios alunos e seus
responsáveis podem acompanhar seu progresso nessas atividades, o que já
constitui outra razão para adotá-las. Como são realizadas em diferentes
circunstâncias, a avaliação delas não tem gabarito único: em sala de aula, as
observações individuais são discutidas e sistematizadas para que o aprendido
individualmente seja elaborado coletivamente. Por vezes, a lição pode demandar
supervisão e atenção contra possíveis riscos. Mas o esforço se justifica por
desenvolver a participação com protagonismo, inestimável para o desenvolvimento
de cada estudante.
A ampliação do conceito de tarefa, portanto, não se resume à maior eficiência,
pois o trânsito de mão dupla entre conteúdos disciplinares e vivência real,
entre a experiência de cada um e o aprendizado de todos, é um aprimoramento do
sentido da Educação.
Vale questionar por que essa prática não ocorre em toda escola ou com mais
frequência. Talvez seja porque, exceto em "estudos do meio" típicos
de certas disciplinas, prevaleça a ideia do dever de casa padronizado com
respostas prontas, quando parece óbvio que alunos pouco interessados na escola
possam se motivar por ações práticas fora dela. Mas as escolas que preveem, em
seus projetos político-pedagógicos, o envolvimento de alunos, famílias e
professores em atividades contextualizadas e com iniciativa como as citadas
passam a atuar como verdadeiras comunidades de aprender."
Luiz Carlos de Menezes
FONTE
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